Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento

Padre Nelson Augusto Aguia – Secretário da Comissão da Arquidiocese do Rio de Janeiro para o Diálogo Inter Religioso

REVISTA MINARETE 25

Padre Nelson Augusto Aguia

1/18/20254 min read

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Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular.

Declaração Universal dos Direitos Humanos

“Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor”

1 João 4, 7-8
Muitos acreditam que, para conhecer a Deus, somente se necessita, e basta, aderir formalmente a um credo religioso pela prática de um culto.

Seguir dogmas ou doutrinas.

Conhecer bem os livros sagrados.

Tudo isso, sem dúvida, tem sua devida e proporcional importância.

Porém, o conhecer a Deus, um Ser Superior, o Sagrado, o Criador se deve dar em primeiríssimo lugar numa comunhão de amor.

Esse, sim, é o grande início do aproximar-se de Deus.

Portanto, quem não ama, ou não se permita amar, mesmo que tenha uma fé absolutamente fervorosa, siga rigorosamente todas as normas da religião, não poderá se entreter firmemente e verdadeiramente com Deus.

Interessante notar, por exemplo, que o intolerante religioso, em geral, conhece textos de cór, recita termos teológicos facilmente, braveja citações, mas não age com amor.

Lembremos que Jesus esteve na sua caminhada com pessoas assim.

E, com tristeza, somos obrigados a reconhecer que os fanatismos são protagonizados também por pessoas religiosas, sem excluir os cristãos.

O radical age com ódio, com rancor, com sentimento de vingança, com desejo de eliminação.

É levado a considerar-se onipotente, e esquecer que todos somos irmãos.

Aceitar o outro tal como ele é, para o intolerante, torna-se um missão impossível, árdua, pois olha o outro tão somente pelo seu prisma dogmático, e não com amor.

A religião, neste sentido, aprisiona, reduz, e se torna inimiga de uma vida espiritual.

O Papa Francisco bem colocou na sua carta encíclia Fratelli Tutti ( todos irmãos), que aquele que vai construindo muros a sua volta, fatalmente vai acabar prisioneiro dentro destes muros.

Não terá a visão dos outros, nunca olhará o mundo sobre diversos e variados prismas, mas tão somente olhará para o muro.

Não irá nunca apreciar a riqueza e a beleza das sementes de uma vida fraterna, experimentada com o outro.

A ciência incha, mas o amor edifica.

I Coríntios 8, 1-3

O conhecimento não é ruim.

Conhecer a própria fé, em sí, não é algo ruim.

Algo, por exemplo, que o Artigo 18 da Declaração NÃO ABORDOU: o direito de estudar e conhecer a própria fé.

Estudar a sua fé é algo, sem sombra de dúvida, salutar, nobre, e até mesmo, necessária.

O diálogo somente se dá na alteridade, no diferente.

Daí que preciso saber e conhecer no que sou diferente na minha fé, em relação ao outro.

Em síntese, eu preciso, então, me conhecer, e saber no que acredito para dialogar, se não será um monólogo, e não um DI –Á - LOGO.

E aqui explico que citei anteriormente a palavra Radical, que em si mesma, também não é ruim.

Vem de Raiz, fundamento, base, sustentação, coluna.

Ser radical neste sentido, não é ruim, mal.

É sim, demonstrar convicção e certeza no que se acredita.

A árvore sem sua raiz, poderá ser qualquer coisa, menos uma árvore.

O extremo sim do sentido de radical, é ruim: o radicalismo.

O que é?

Eu descubro, por minhas próprias forças, e não pelo Espírito de Deus, que o fundamento está apenas comigo, e nunca com o outro.

Ou seja, eu me torno o dono da verdade, o centro absoluta da verdade.

E, assim, quando não estamos acompanhados pelo amor, isso não resultará em um conhecimento profundo de Deus, mas, em vez disso, resultará num envaidecimento, em orgulho, ensimesmar-se, dessinterando-se dos outros, se torna um indiferente.

Pervesão do convicto é, portanto, o radicalismo.

O orgulho é a argamassa do muro que falei anteriormente.

O fato é que ninguém pode se sentir fiel a sua fé, cumprindo tudo o que esta exige, mas julgando-se por isso com mais dignidade do que os outros.

“Se alguém ama a Deus, esse é conhecido dele”.

I Coríntios 8, 3

Tenho que aprender: Deus é Deus, e Ele se manifesta como quer, onde quer, e com quem ele quer.

Não queiramos colocar amarras no Senhor Todo Podesoso.

Não vai dar certo.

Nem mesmo por uma letra que pode se tornar fria e sem vida como podemos tornar e estamos tornando a Declaração Universal.

Deus não precisa de um aval do homem para agir.

Neste sentido, devemos aceitar que nenhuma religião tem a propriedade de Deus.

O Papa Francisco já afirmou: Deus, não é Deus dos católicos, mas é Deus.

“Se alguém diz: Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu? E dele temos este mandamento: que quem ama a Deus, ame também a seu irmão.”

1 João 4, 20-21

Ninguém pode dizer: amo a Deus, mas odeio o irmão.

Qualquer religioso que diga, ou faça isso, não é religioso, mas sim hipócrita.

Se pudermos resumir toda a vida de Jesus, aqui está a sua síntese.

O amor a Deus, passa necessariamente pelo amor ao próximo.

Desculpa afirmar o óbvio, mas até o obvio está sendo esquecido.

Pergunta: o que é necessário tanto para conhecer, quanto para ser conhecido por Deus?

A resposta é o amor de uns pelos outros.

Se vivermos radicalmente assim – acentuo a palavra radical novamente - cristãos ou não, crentes ou não crentes, homens e mulheres de boa vontade, tenho certeza, nem saberiamos o que seria a palavra intolerância, ou discriminação.

Vamos renunciar à mesquinhez, ao ressentimento, às contraposições sem fim.

Vamos assumir nossas próprias limitações, em vez de fomentar ódios e rancores.

Alimentemo-nos do que é bom, e todos, e todas as religiões, vamos nos colocar a serviço do bem.

Faço votos, que neste aniversário de 8 (oito) anos da Revista Minarete, ela possa continuar a ser um veículo eficaz de divulgação da comunidade muçulmana Xiita.

Contem sempre com meu apoio, minha amizade e continuemos unidos a divulgar o diálogo e o respeito entre todas as religiões, como temos feito até este momento.

Mais uma vez: Parábens à Edição Especial da Revista Minarete.

Fraterno Abraço,

Padre Nelson Augusto Aguia – Secretário da Comissão da Arquidiocese do Rio de Janeiro para o Diálogo Inter Religioso